A ecologia à serviço do capitalismo
A defesa do meio ambiente contra o aquecimento global parece ter se tornado um grande consenso mundial, acima da luta de classes. Uma conferência mundial patrocinada pela ONU para dezembro discutirá o tema. No Brasil o governo Lula encaminha a revisão do código Florestal e a candidata do partido Verde, senadora Marina Silva, adota a ecologia como seu principal tema de campanha (ver box). Mas todos contornam o principal problema e ameaça ao meio ambiente: a manutenção do capitalismo. As notas abaixo trazem informações para que os trabalhadores e a juventude reflitam e se posicionem.
No Brasil o debate sobre o clima está diretamente ligado a questão da terra, isso porque se calcula que 75% das emissões de gás carbônico venham da devastação florestal. O decreto 6686/2008, que está sendo rediscutido e pode ser revisto, determina que os proprietários apresentem até 11 de dezembro deste ano planos de cumprimento da legislação para recomposição das áreas de preservação de florestas. Na Amazônia isto representa 80% da reserva legal e no restante do país 20% do total da propriedade. Por pressão dos latifundiários o prazo pode ser prorrogado para o meio do ano que vem. Além disso, uma reformulação do Código Florestal de 1965 prevê a criação de um verdadeiro mercado de destruição das florestas, com cotas que poderiam ser compradas por quem desmatou tudo. Por exemplo, um grande plantador de cana-de-açúcar poderia comprar cotas de quem desmatou menos. Hoje existem conhecidas cerca de 5 milhões e 170 mil propriedades rurais no país.
O pacote ambiental (Política Nacional sobre Mudança do Clima) que o governo pretende aprovar, até o final do ano, e que vem sendo comandado pela bancada ruralista, tramita no Senado e foi aprovado em 27 de outubro na Câmara dos deputados. Ele preserva os interesses dos grandes capitalistas do campo (o agronegócio), e na prática cria obstáculos para o avanço da reforma agrária em nome da preservação do meio ambiente. A proposta agrada ao agronegócio porque incentiva o uso dos biocombustíveis (hoje extraído principalmente da soja) e o plantio de árvores não nativas (empresas de celulose, papel) em parte das áreas de reflorestamento, produtos que exigem altos investimentos.
O esforço do governo para aprovar uma nova legislação ambiental está ligado a realização da Conferência Climática patrocinada pela ONU ocorrerá em dezembro na cidade de Copenhague (Dinamarca). Esta tem como objetivo estabelecer novas metas para combater o aquecimento global e aprovar um novo “pacto” global sobre o clima. O governo do Brasil pretende aprovar um mecanismo que preveja que o desmatamento evitado de florestas seja considerado redução de gases que provocam o efeito estufa. Esta medida poderia no futuro gerar créditos em um mercado especulativo de gases poluentes.
O mercado da poluição e o Protocolo de Quioto
O protocolo de Quioto foi adotado por 159 países em dezembro de 1997 e tem o compromisso de 39 países industrializados de reduzir a emissão de seis gases (como o gás carbônico ou CO²) que provocariam o efeito estufa responsável pelo aquecimento global. O protocolo entrou em vigor em fevereiro de 2005. Nos países de economias pouco ou recém industrializadas como Brasil, China e Índia, não foram estabelecidas metas de redução. Com isso, se os preços das cotas para emitir CO² for muito caro para uma indústria na Europa, ela pode simplesmente fechar e ser transferida par ao Brasil em busca de salários mais baixos e sem limites para poluir. Ou seja, a defesa do meio ambiente torna-se uma desculpa para fechar fábricas ou reduzir direitos dos trabalhadores.
A emissão na atmosfera do gás carbônico seria o principal responsável pelo aumento de temperatura? Os cientistas não estão de acordo sobre esta questão, mas decisões já foram tomadas. Os dirigentes da ONU discriminaram e afastaram dos debates os cientistas que não concordavam com a tese de que o aquecimento global era provocado apenas pelas emissões de gases poluentes. Para esses cientistas é muito cedo para comprovar que é o gás carbônico o principal responsável pelas alterações climáticas e o aquecimento global. Eles afirmam que existem muitos fatores que interferem no aquecimento do clima, como a própria água dos oceanos que evapora CO² e lembram que o gás carbônico representa apenas 0,038% da atmosfera. Embora não haja consenso entre os cientistas, os capitalistas perceberam que o debate sobre o efeito estufa e o aquecimento global é uma forma de turbinar seus negócios.
Foi criado um mercado de trocas de cotas de emissão de gás carbônico nos países com indústrias poluentes e esses países estabeleceram metas de redução de CO². Assim, os países e as indústrias têm “direitos de poluição” em toneladas de carbono, que podem trocar ou vender. Criou-se uma falsa solução - um sistema que seria regulado pelos próprios mercados - para que os capitalistas ganhem dinheiro na especulação financeira com a redução dos gases que supostamente provocam o efeito estufa (aquecimento global).
Entidades como o Greenpeace a uma constelação de ONGs ocupam aí todo o seu lugar, disputando verbas da ONU e outros organismos para defender campanhas e sugar recursos dos estados. Reforçam a onda dos “produtos ecológicos” que se utilizam do fantasma do efeito estufa e do aquecimento global para vender mercadorias “limpas”. Campanhas de marketing passaram a vender uma boa imagem das empresas que estariam defendendo o meio ambiente em nome da “responsabilidade social” e do “desenvolvimento sustentável”.
Tenta-se culpar todos igualmente, como se o trabalhador que pega ônibus ou carro para ir trabalhar tivesse a mesma responsabilidade o grande capitalista industrial. Como se o latifundiário que devasta a Amazônia para vender madeira tivesse o mesmo papel que o trabalhador sem-terra que planta para sua sobrevivência. O capitalismo fez com que a relação dos homens com natureza se transformasse hoje em uma relação não só de exploração dos trabalhadores, mas de destruição crescente do meio ambiente.
Marina Silva e o consenso ecológico com a burguesia
Embora afirme discordar da política do governo Lula para o meio ambiente, Marina Silva reforça o discurso ambientalista que não responsabiliza a burguesia e o capitalismo pela degradação do meio ambiente. Como é possível um “desenvolvimento sustentável” mantendo o capitalismo? A burguesia se utiliza da ciência, da técnica, da ecologia não para melhorar as condições de vida dos seres humanos, mas para ampliar a acumulação de capital. Ao sair do PT Marina saiu de um terreno privilegiado de disputa no interior da classe trabalhadora. A sua chapa presidencial tende provavelmente como vice o presidente na empresa de cosméticos Natura é um exemplo concreto da utilidade do discurso ambientalista à serviço da acumulação de capital. A luta ambientalista separada da luta de classes contra o capital torna-se não apenas um discurso diletante, mas um instrumento a serviço dos interesses do capitalismo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário